domingo, 5 de maio de 2013

Projeto Volta Atlântico - Etapa 11 - Sint Maarten/Saint Martin - Esquina dos navegadores

Com a partida do Vitor, a fase Caribe se encerra. Foi um tempo onde muitos tripulantes se revezaram e, muitos lugares paradisíacos curtimos. De meados de novembro até agora (fim de abril), andamos apenas 500 milhas, sempre em busca de abrigos, enseadas, águas limpas e cenários de uma natureza exuberante. Realmente o Caribe merece ser considerado um dos melhores lugares do planeta para se curtir um barco.
Agora, nosso foco está já no caminho que nos falta percorrer. E não é pouco. Estamos já a nove meses no mar, navegamos 5.300 milhas desde que soltamos as amarras no Iate Clube Veleiros da Ilha, naquela noite de chuva e vento sul, no fim de julho.
Temos pela frente, para concluir nosso projeto, aproximadamente 8.000 milhas, que pretendemos fazer em 6 meses. Isto significa dizer que agora será muito mar e pouca terra.
O Firulete está ancorado dentro do Lagoon, em Sympsom Bay, e as fotos abaixo perfazem os 360 graus a sua volta.

Praticamente todos os barcos que aqui estão, se preparam para partir. Até o fim de maio todos desaparecem. Alguns vão para o sul (Trinidad) para passar a temporada dos furacões, outros seguem para o Panamá, com o objetivo de atravessar o Pacífico, muitos retornam para a América do Norte (EUA e Canadá) e lá se entocam para se proteger dos ciclones, e muitos, entre os quais estamos, seguem para os Açores e Europa. Todos os anos isto se repete. É o ciclo do Atlântico norte.

Estamos portanto numa etapa de preparação do barco para a travessia. Fazendo esta manutenção, curativa e preventiva, já nos preparamos psicologicamente para o desafio, e aumentamos a confiança no barco e na sua capacidade.
Aqui, mais um reparo no piloto automático, desta vez para substituir os pinos plásticos que quebram. Acho que agora não sobrou mais nada que possa quebrar. Precisamos muito deste equipamento na travessia, pois senão teríamos que conduzir o barco 24 horas, todos os dias, e isto seria muito extenuante. Ele será um valioso tripulante.

O motor de popa, nosso meio de transporte nestes tempos de ancoragem, tem trabalhado muito e exigiu também um carinho.

A mesa de navegação se enche de lembretes com tarefas imprescindíveis. A lista cresce numa velocidade maior do que podemos executá-las.

Troca de alguns cabos. Este o da "adriça da grande", que trocamos por um de spectra, ...

a troca do líquido da bússola, para tentar recuperá-la, pois seu rumo não está confiável.

Para garantir, compramos uma nova, pois o preço aqui está metade daí do Brasil. Vou levá-la de reserva.

Surgiu uma infiltração no falso espelho de popa que estava colocando uma água para dentro. Levei semanas monitorando esta água até descobrir a origem. A vedação precisou ser refeita.

Neste tempo, o bote, que as noites sai da água para evitar roubo e cracas, ganhou um novo lugar. Passou a ser içado pela adriça, na borda. Isto exigiu a instalação de três pontos de fixação na fibra do bote.

Nas constantes idas nas lojas náuticas, vamos descobrindo novidades e precisamos estar ligados com os gastos, pois são muitos os apelos ao consumo. Vou me acostumando com o US dólar como moeda corrente e no fim tudo parece barato, esquecendo que o aposento é em real.

Apesar de estarmos todos envolvidos nos seus barcos, cada um com a sua lista de tarefas, sempre rola algum encontro, confraternização, e motivo para bebemorar.
Aqui, no convés do Suan Like, dos simpáticos Matias e Madalena, os argentinos que conheci em Natal, com mais o casal do barco Líbero (ele italiano e ela brasileira) mais o Piter, do Onda Boa, que conheci em Recife.

Eliane e Cristiano, do veleiro Líbero, estão de partida para atravessar o canal do Panamá e vêm convidar a turma para uma festa de despedida,...

que foi uma beleza. Conheci mais alguns brasileiros embarcados.

Todos os dias saem barcos e como estou perto da ponte elevadiça fico acompanhando o movimento. Este, com bandeira brasileira, está partindo para Miami. Nem cheguei a conhecer a tripulação.

Vários são os barcos brasileiros que por aqui estão. Todos na mesma função. O Amazonas, de Camboriú, com o Eduardo Zanella e o Tedo, ambos muito boa praça, estão preparado o barco para a volta ao Brasil,...

O veleiro Ondine, um 85 pés, de 1969, 45 toneladas, em alumínio, foi por muito tempo record da regata Buenos Aires- Rio, foi também o primeiro Cisne Branco, barco-escola da Marinha do Brasil. É muito bem cuidado pelo Clidenor, um baiano que dá o maior apoio aos navegadores brasileiros que por aqui passam.

O Aya, um Cabo Horn 40, do Tadeu e Ricardinho (pendurado no mastro), do Yate Clube do Rio de Janeiro. Seguem para o Açores,...

o Garua, dos hermanos Jorge e Silvia, parceiros já do Costa Leste de 2010, levantando ferro para voltar para Trinidad,...

o catamarã Delphis, da família barasileira Marco e Cris com os filhos Zélu, Luqui e Marina, que recepcionaram o Firulete, quando chegávamos em Grenada. Como bons brasileiros adoram festa e aqui, recebem os amigos mais uma vez. Estão também seguindo para o Açores, juntamente com o veleiro Sobá (de Vitória), do Ricardo e Maitê com filhos Diego e Eduardo,...

o Bar a Vento, dos amigos Alípio e Gil, que venho encontrando desde Natal. Um simpático casal de Santos que está indo pela segunda vez para os Açores, agora para entrar no Mediterrâneo.
Como podem ver, o Firulete está muito bem acompanhado.

Nestes períodos em que estive só no barco, além das tarefas rotineiras de manutenção e sobrevivência aproveitei para ler muito. Alguns livros de navegação, como este que ganhei de presente de aniversário, do Rodrigo, que relata uma viagem com o roteiro que estou fazendo,...

o livro que o Zaca, sogro do Evoy, deixou para mim. Um ótimo livro que conta a saga do ex-presidente Roosevelt, junto com o marechal Rondon, perfazendo um rio da amazônia até então desconhecido, no início dos 1900, ...

  
e outros livros que o Vitor me trouxe que estou devorando rapidamente.

Tenho ainda o livro do colega arquiteto de Criciúma, Fernando Carneiro, que me ajuda a matar as saudades da minha cidade. Foi um presente que a Renise me mandou, acho que exatamente com este fim.

E chega o Cesar, meu irmão caçula, que vai fazer o resto da viagem comigo.

Chegou cheio de gás, mas como temos ainda uns dez dias de espera para a partida, fica gastando as energias correndo, nadando, pesquisando os mercados para fazermos o rancho da viagem,...

 e me ajuda na tarefa da preparação do barco.

Fizemos o acréscimo no compartimento do gás, para poder caber os botijões de fibra que adotamos,...

colocamos um reforço no espelho de popa, que estava trincado por uma batida no pier, ainda em Salvador,...

fizemos uma revisão geral no mastro, adaptamos adriças para receber a nova vela tormentin e instalamos o novo defletor de radar,...

instalamos em nova base, a antena do gps,...
e trocamos os espelhos do banheiro, que são de acrílico (por segurança).

Para dar um refresco para o Cesar, antes que se arrependa de ter vindo, fomos passar o domingo na praia. Foi um dia de sol, mas também com sombra e água fresca.

Na segunda feira, voltamos ao trabalho. Fizemos pão, inaugurando o forno do novo fogão. Na travessia vamos levar pão para 10 dias, que é o que costumam aguentar, e depois terá que ser feito a bordo, mas o Cesar já foi quase padeiro profissional e isto será canja.

Durante o dia são muitas as andanças. O Cesar trilha os mercados pesquisando os preços e fazendo as compras.

Tudo vai sendo transportado com o bote e acondicionados a bordo de forma que não saiam voando nos momentos de mar grande.

Nestas andanças vamos registrando coisas inusitadas, como esta insinuante sereia na proa de um barco,...

este charmoso veleirinho, cujo nome revela sua idade (Ano 1941).

O clima já apresenta sinais da aproximação do verão. Reduziu significativamente o vento e já ocorre até algumas calmarias. Os fins de tarde também mudam sua cor,...





é quando, geralmente estamos tomando nosso banho de convés.

As noites, depois da janta, temos o nosso jogo de xadrez.
E assim passam rapidamente os dias e se aproxima a nossa partida.

A dias viemos observando, numa boia na nossa popa, o ritual de um acasalamento dessas aves. Tudo começou a três. Havia uma disputa, só não entendi se pela fêmea ou pelo macho.

No 3º dia, depois de a fêmea entoar um cantos repetidos e diferentes eles começaram as tratativas para garantir a próxima geração. Olhem a carinha de alegre dele e a de indiferença dela. Concluí que é porque ele sofre de ejaculação precoce.


Bem pelo contrário, na nossa proa apareceu um vizinho barulhento. Começaram uma obra de alargamento do canal de navegação.

Depois de uns dias, entendemos o porque. Chegou o navio holandês trazendo a parte metálica da nova ponte que está em construção e divide o Lagoon ao meio.
O navio entrou pelo canal da ponte elevadiça, raspando as duas cabeceiras. Foi uma entrada festiva. Buzinaço, fogos, faixas e muitos barcos recepcionando e fotografando.

O navio passou do nosso lado e a ponte, muito elegante, é do tipo que gira 90º numa base central e abre dois canais de mão e contramão. Vai ficar uma bela obra.

 A noite, o navio já ancorado no vão central da nova ponte, ostenta uma iluminação bastante festiva,...

que a orla em sua volta parece acompanhar.

Num canto do Lagoon, fica o bar-marina Laggones, a anos é o point dos brasileiros. É onde está o Amazonas, e o  Zanella colocou uma enorme bandeira do Brasil no mastro da sede.

 Alí a gente está sempre se encontrando e sabendo dos preparativos e das novidades de cada barco.
O da esquerda é do Capitão Morgan, barco brasileiro que navega pelo Caribe já a 14 anos. O segundo é o Alex, carioca, mora a anos em Sint Maarten e trabalha com charter. Tem sempre muitas dicas para dar aos que por aqui passam. O terceiro (de pé) é o brasileiro que está comprando o Capitão Morgan. Depois vem a Gil e o Alípio, de Santos, e torcedor,...

do veleiro Bar a Vento, que está do lado do Firulete.

Na noite do 1º de maio, os "trabalhadores" brasileiros comeram um churrasco, assado e organizado pelo Zanella. No pier, ao lado do Amazonas. Bela festa que antecipa a despedida para todos.

Fui ainda em Phillipsburg para fazer uma compras. Encomendas da família. É tanto turista brasileiro comprando que algumas lojas até ostentam a bandeira brasileira na fachada.

Na última hora ainda comprei um GPS de mão, para ficar com um terceiro e a pilha, pois os outros dependem da bateria do barco. Isto para maior segurança,...

e comprei o AIS, um receptor que capta posição, velocidade e rumo de todas as embarcações comerciais ou não, com mais de 20 metros de comprimento, que obrigatóriamente emitem este sinal.
O AIS torna-se muito valiosos para se navegar nas rotas comerciais de grande tráfego, como as que vamos passar na aproximação da Europa e do estreito de Gibraltar, principalmente por causa das frequentes neblinas.

Estamos praticamente prontos para a partida. A todo momento ocorrem despedidas. Aqui passa o Matias e a Madalena para um adeus. Eles vão levar o barco para Trinidad, que por sinal foi colocado a venda.

Hoje pela manhã passamos pela ponte para ancorar do lado de fora do Lagoon. Vamos limpar o casco das cracas e parasitas deste tempo parado.
Ontem para safar a âncora do fundo lodoso foram quase duas horas de lida. Mergulhamos sobre a âncora, achando que havia engalhado em algo, mas estava mergulhada uns 50cm na lama.
Amanhã faremos os custons (saída oficial na imigração) e partiremos para Açores.
Estamos preparados. Barco e tripulação estarão então novamente nas mãos de Netuno, Posseidon, e todas as entidades que regem o mar e o universo.
Quem quiser mandar seus bons fluídos, energias e rezas para ajudar, serão com certeza bem vindos a bordo.
Aguardem a postagem de Açores, daqui a aproximadamente 1 mês.
Quem quiser acompanhar o desenvolvimento de nossa travessia, poderá acessar o site do nosso spot:
que pretendemos manter ligado durante todo o percurso.
Tchau!